Como visitar a Aldeia Indígena Pataxó em Porto Seguro (BA)

“É o breu-branco, cura qualquer dor de cabeça.” Diz Yantrã, jovem da Aldeia Indígena Pataxó, espremendo dedos numa seiva gelatinosa, recém-raspada do caule da árvore.  

Brinco que seria uma saudável alternativa à Neosaldina, cada vez mais presente na minha vida. “Pena que haja mais drogarias do que pés de Burserácea no Rio de Janeiro”, diz ele.

Os Pataxós não são muito de sorrir. E tem lá motivos. Perseguidos desde sempre, vêm costurando uma história de superação a desapropriações, ataques e crueldades.

Nômades, vieram do interior de Minas Gerais, empurrados pelas perseguições, até o sul da Bahia, na região do Monte Pascoal, onde estabeleceram uma aldeia no século XIX. Em 1951, um incêndio criminoso a destruiu, fragmentando o grupo. Dos sobreviventes, muito deslocaram-se para as cidades, poucos permaneceram.

A alguns metros da árvore, o jovem pataxó aponta para pequena escola frequentada pelas crianças da aldeia, até o quinto ano do ensino fundamental.

Lá, aprendem, entre outras coisas, o ‘patxohã’, língua nativa com cerca de cinco mil palavras catalogadas. “Muitos professores pataxós já foram alunos daqui. Alguns hoje representam a aldeia em outras escolas municipais e estaduais.”

Depois de quase sumirem do mapa, os pataxós reergueram-se a partir de uma iniciativa que conjuga um saudável #intercambiocultural e sustenta os habitantes da aldeia, na Reserva da Jaqueira da Terra Indígena Coroa Vermelha, localizada entre os municípios de Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália, litoral sul baiano.

Desde 1998, os Pataxós vêm abrindo as portas de casa, na área delimitada à reserva. Recebem visitantes para conhecer seus costumes, modos de habitar, de viver, de saudar a vida. E aprenderam a monetizar o trabalho.

aldeia indígena pataxó, reserva da jaqueira

Ameaçados pelo #MarcoTemporal, que poderia desapropriá-los de uma hora para outra, as visitas, atualmente, sustentam 34 famílias genuínas que lá residem mantendo tradições e costumes. Votações no Congresso e decisões do Supremo vem sendo acompanhadas regularmente, inclusive (e sobretudo) debatidas diariamente com os visitantes.

Argumentam, os Pataxós, oportunamente, que o marco não leva em consideração a história de desapropriação, opressão e deslocamento que enfrentaram ao longo dos séculos.

“É uma ficção temporal, constituída a partir de uma interpretação restritiva e preconceituosa da Lei, que contraria o espírito da Constituição e ameaça os direitos territoriais garantidos na legislação brasileira”, afirma Nitinauã, uma das lideranças da Aldeia Pataxó da Jaqueira.

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Vamos a um ‘kjeme’, típica cabana indígena de parede de argila e teto de palha (as famosas ocas, como são chamadas pelos povos indígenas do Sudeste). “No passado, a palha descia até o chão, mas isso caiu em desuso por conta do ressecamento das folhas, que atraia barbeiros e escorpiões”.

Ele me fala de sua infância, quando era comum botar as crianças para dormir numa elevação de madeira, cobrindo o chão das duas entradas sem porta (uma ao leste, outra à oeste, para aproveitar a luz do sol), com um tapete em brasa viva para afastar os terrores da madrugada.

“Havia uma cobra que jogava terra na brasa com o próprio rabo para aliviar a temperatura e ultrapassava o tapete quando bem queria”, lembra Yantrã , com merecida dramatização.

A Terra Indígena Coroa Vermelha (uma área de 1.420 hectares às margens da BR 367) foi demarcada a partir de 1996, junto aos 72 hectares da Reserva da Jaqueira, onde ocorrem, propriamente, as visitas.

Os pataxós, porém, estão hoje distribuídos em toda vizinhança. São cerca de 15 mil pessoas residindo em 36 aldeias no sul da Bahia – Porto Seguro, Santa Cruz Cabrália, Prado e Itamaraju – e em seis em Minas Gerais, nos municípios de Carmésia, Arassuaí, Açucena e Itapecerica.

Apesar da importância histórica da região, onde houve o primeiro contato dos portugueses com os indígenas, os tupiniquins, e não os pataxós, é que residiam no local na ocasião. O simbolismo das raízes históricas dos povos indígenas no Brasil, porém, se mantém com a presença dos pataxós.

aldeia indígena Como visitar a Aldeia Indígena Pataxó em Porto Seguro (BA)

O chá que me oferecem é amargo, ao menos amargo demais para meu paladar cara-pálida. Os complementos ficam por conta da farinha de puba, mandioca, bolos, beijus e goles de chás. Mas o peixe assado em folha de patioba, o mangute, cai nas graças de todos. Assado num forno de pedra, dentro de um kjeme, que fazia as vezes de cozinha comunitária.

De terça a domingo, o que não falta é cara-pálida na Reserva da Jaqueira. A maioria, brasileiros; mas há estrangeiros também. Vêm botar o pé na lama, pintar o rosto de urucum, extrair seivas das árvores e rapés das plantas.

Acompanham rituais de danças circulares, histórias e lendas em volta da fogueira, aprendem sobre a confecção de armas e adornos, sobre o conhecimento das ervas medicinais. Testemunham in loco a intimidade do pataxó com a natureza.

Quando entramos na tenda principal da aldeia, fui direto ao centro, seguindo os passos cadenciados do tambor. Ele marca os tempos fortes, quando deve-se pisar com intensidade e sacudir o maracá acima dos ombros.

Seguimos em movimentos circulares pela tenda, cantando em coro o cântico patxolá que nos é ensinado em tempo real. São os instantes finais da visitação, um momento de intensidade, forte, emocionante, imersos no ritual sagrado da aldeia.

Exemplo de projeto ecoturístico que associa a preservação ambiental a experiências que inserem os visitantes nas práticas cotidianas, originais e ordinárias de um povo indígena.

Ocasião em que os Pataxós conseguem se sustentar sem distanciarem-se de seus modos de vida e, ao mesmo tempo, promover e difundir sua cultura e o conhecimento indígena. Ganham todos.

Para agendamento da visita à Aldeia Pataxó da Reserva da Jaqueira e mais informações (disponibilidade, preços, horários, acesso e etc), clique no banner abaixo.

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Daniel Marinho

Daniel Marinho

Editor do Escriba de Bordo

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